Via de regra, a criação de novas taxas e impostos é uma medida impopular. Mas essa tem sido a alternativa de cidades mundo afora, inclusive no Brasil, para tentar reverter para o bem comum o uso da cidade pelos aplicativos de transporte sob demanda.
Serviços de empresas como Uber, 99 e Cabify trouxeram consigo uma sensação de conforto para a população. Praticidade de embarque e de pagamento, custo acessível para distâncias curtas e grande oferta atraíram uma alta demanda para esse novo modal.
Ocorre que o crescimento da frota desses veículos, impulsionado pela redução dos postos formais de trabalho, veio acompanhado de uma consequência já dramática para as grandes cidades: o aumento dos congestionamentos.
Diante desse dilema, importantes cidades mundiais decidiram agir. Mesmo que a contragosto da população em geral. Nova Iorque, Washington, Londres, Chicago, Seatle, Fortaleza, Rio de Janeiro, Curitiba e São Paulo têm taxas sobre o transporte individual ou, ao menos, aprovou legislações nesse sentido (Veja detalhes abaixo).
Uma das argumentações é de que essas empresas exploram o viário urbano sem qualquer compensação aos cofres públicos. A outra é de que esses recursos poderiam financiar sistemas de transporte mais sustentáveis, como a implantação de ciclovias e outras infraestruturas viárias ou o custeio de sistemas de transporte coletivo, e atender uma demanda fora dos cinturões mais bem servidos por transporte coletivo, como as periferias.
Há, inclusive, cidades que criaram taxas diferentes para viagens fora dos horários de pico ou mais distantes, o que indica uma democratização do acesso ao transporte. Londres, por exemplo, taxa todos os veículos individuais que entram no seu centro expandido, sejam eles de carona ou não. Curitiba adota preços mais baixos para viagens mais distantes. Nova Iorque concede desconto na sobretaxa se a viagem for compartilhada. Fortaleza reduz pela metade se a empresa de tecnologia realiza investimentos em calçadas e ciclovias.
O QUE PENSAM OS ESPECIALISTAS
A medida, apesar de pouco popular, é vista com bons olhos por especialistas.
“O debate que deve pautar a decisão é justamente como promover um sistema de mobilidade inclusivo, acessivo e que privilegie deslocamentos a pé, por bicicleta e por transporte coletivo público. A taxação de determinado modal precisa estar relacionada a essa estratégia”, avalia Paulo Nascimento Neto, professor do Programa de Pós-graduacão em Gestão Urbana (PUCPR) e pesquisador líder do Centro de Estudos em Política Urbana (CE.URB.).
Advogado responsável pela área de Contratação Pública do escritório Braz Campos Advogados, Pedro Augusto Schelbauer de Oliveira pondera que a taxação em si ainda não foi totalmente vencida na esfera judicial.
“A chamada ‘Lei do Uber’ (Lei nº 13.640/2018) não prevê – para permitir ou vedar – a possibilidade de cobrança de taxas ou preço público. E alguns tribunais (como o TJSP e o TJDFT) têm considerado inconstitucional a imposição de tais cobranças pelos Municípios. Mas é um tema ainda não resolvido e que certamente ainda terá maior discussão.”
FROTA INDIVIDUAL
A frota de veículos no Brasil que cresceu 63% na última década – passando de 67 milhões em 2011 para mais de 109 milhões em 2021. Apesar de ocuparem 70% do espaço nas vias, os automóveis transportam, em média, apenas 20% da população diariamente.
CURITIBA
Segundo dados da prefeitura de Curitiba, em setembro deste ano, havia 15.566 pessoas cadastradas em seu sistema para trabalhar como motorista de transporte individual de passageiros. O número pode não corresponder à realidade devido à alta no preço dos combustíveis, que vem fazendo muitos motoristas desistirem da função.
De 2017 para cá, o município arrecadou R$ 66 milhões. O volume anual, porém, caiu 43% de entre 2019 e 2020 – em função da crise econômica causada pela Covid-19. Os valores arrecadados em Curitiba vão para um caixa geral e são utilizados nas áreas mais essenciais da cidade, segundo a prefeitura.
Confira abaixo um quadro com a arrecadação ano a ano com a “taxa do Uber” em Curitiba. Perceba a queda nos anos de 2020 e 2021, período com forte retração causada pela pandemia da Covid-19.